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Arquipélago de Bailique no estado do Amapá, extremo norte do Brasil. Região  sensível, biodiversa  e ameaçada pela extração de petróleo. Foto: Victor Moriyama/Greenpeace

O ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, do PSD de Minas Gerais, fabricou uma “controvérsia jurídica” para evitar uma avaliação responsável sobre os impactos ambientais e econômicos da abertura de uma nova frente de exploração de petróleo no litoral da Amazônia. É essa a finalidade do parecer pedido por Silveira à Advocacia-Geral da União (AGU) e divulgado na terça-feira 22 de agosto. Com ele em mãos, o ministro tenta passar por cima do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no processo de licenciamento do bloco 59 da Petrobras, na bacia da Foz do Amazonas, e obter a autorização para a perfuração numa “câmara de conciliação”. A manobra foi rejeitada pela ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva. “Não há conciliação para questões técnicas”, disse ela no Senado nesta quarta-feira, 23 de agosto.

O parecer da AGU trata do argumento do Ibama e do ministério de Marina sobre a importância da realização de uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) de toda a margem equatorial do Brasil, o litoral que vai do Rio Grande do Norte ao Amapá, antes que se abra ali uma nova fronteira de exploração petrolífera. A AAAS é um instrumento dos ministérios do Meio Ambiente e de Minas e Energia que permite avaliar o impacto cumulativo de toda a cadeia do combustível fóssil numa área ambientalmente sensível. Sua utilização está baseada nos princípios da responsabilidade e da precaução.

Hoje, há 41 blocos já licitados na margem equatorial, nove deles na foz do Amazonas. A licença para a perfuração de um bloco poderia abrir um precedente para os outros. O parecer da AGU afirma que a AAAS não é uma precondição para o licenciamento – mas o Ibama e o Ministério do Meio Ambiente jamais alegaram que era. O que eles buscam é uma solução técnica para que uma decisão vital de política pública, com impactos sobre a maior floresta tropical do planeta, possa ser tomada de maneira bem informada, eliminando a “possibilidade de um salvo-conduto para a incerteza”, como disse o Ibama no parecer em que recomendou que a licença para a perfuração fosse negada. Ao recorrer à AGU, Silveira rejeitou o caminho técnico, manobra em que é apoiado por outros setores do governo, com o aparente aval do presidente Luiz Inácio Lula da Silva – que disse no início de agosto que o Amapá poderia “continuar sonhando” com a exploração de petróleo em sua costa.

O licenciamento do bloco 59 começou há dez anos, e a perfuração em blocos próximos já havia sido negada pelo Ibama em 2018. Essa demora tem justificativa. Trata-se de um litoral piscoso, de mangues – ecossistema muito sensível a derrames de óleo –, e onde vivem espécies ameaçadas de extinção. Além disso, a dinâmica das correntes marinhas na região, três vezes mais fortes do que as do litoral do Sudeste, é pouco estudada.

Em razão dessa insegurança, o Ibama levantou a possibilidade de que fosse feita a Avaliação Ambiental de Área Sedimentar, para permitir uma decisão responsável. Em um parecer de 31 de janeiro, os técnicos do órgão dizem textualmente que “não temos instrumentos jurídicos para justificar a recomendação de não emissão de licenças ambientais de perfuração exploratória até que seja realizada uma avaliação ambiental estratégica”. Na ausência dela, porém, afirmam, “a manifestação favorável quanto à viabilidade ambiental de projetos de perfuração exploratória é fragilizada e não garante” que as etapas seguintes, da eventual produção de petróleo, “tenham sua viabilidade ambiental garantida”.

O parecer da AGU, no entanto, subscreve a posição de Silveira ao mencionar a suposta “controvérsia jurídica” levantada por ele. Diz que “no plano fático” o Ibama tornou a realização da AAAS uma condicionante para o licenciamento. “Não há como se afirmar que não se está, ainda que por via transversa, ‘exigindo’ a realização da AAAS no bojo do licenciamento ambiental”, diz o parecer de 22 páginas. Ou seja, a AGU endossa Silveira ao tratar o caso como se ele se resumisse a um debate de forma – e não de conteúdo.

A partir do parecer, a pasta comandada por Jorge Messias afirmou em nota que considera que a questão da AAAS está superada. A AGU pediu então à Câmara de Mediação e de Conciliação da Administração Pública Federal a abertura de um processo sobre os demais pontos que haviam levado à negação da licença pelo Ibama – o impacto nas terras indígenas da região do Oiapoque e as inconsistências no plano apresentado pela Petrobras para a proteção da fauna. A Câmara é um órgão da AGU no qual se discutem litígios dentro do governo ou entre o governo e terceiros. No entanto, para que o processo ocorra, é preciso que todas as partes estejam de acordo, e a ministra Marina Silva afirmou que continuará resistindo. “Eu não posso colocar numa rodada de conciliação a Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] para decidir, por decisão política, administrativa, se um remédio é tóxico. É a mesma coisa com as decisões do Ibama”, exemplificou ela no Senado.


Checagem: Plínio Lopes
Revisão ortográfica (português): Elvira Gago
Tradução para o espanhol: Meritxell Almarza
Tradução para o inglês: Sarah J. Johnson
Edição de fotografia: Lela Beltrão
Edição de página: Viviane Zandonadi

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