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A ilha-símbolo de Altamira, que Belo Monte desmatou e começava a se regenerar, agora virou cinzas. Foto: SOLL/SUMAÚMA

A Ilha do Arapujá morreu pela segunda vez. Um incêndio, na virada de outubro para novembro, matou cerca de 30% das terras da ilha arrodeada pelo Rio Xingu. Da orla do cais da cidade de Altamira, no Pará, o Arapujá nos encara. Agora com as marcas deixadas pelo fogo, no ano de uma seca extrema na Amazônia.

Foram três dias de fogo que cercou a cidade de fumaça e destruiu 30% do Arapujá. Foto: EL-Elyon Machado

Faz 70 anos que o Arapujá encara Antonia Melo. Desde 1954, quando, ainda menina, ela chegou a Altamira com a família, migrantes vindos do Nordeste. A coordenadora do Movimento Xingu Vivo para Sempre testemunhou as duas mortes da ilha que vestia a lua. É assim que Antonia lembra do Arapujá. “Era uma coisa linda. Muita floresta. A lua, quando saía, saía atrás daquela floresta do Arapujá. A floresta vestia ela.”

A Ilha do Arapujá aparece no livro Viagem ao Xingu, de 1897, escrito pelo geógrafo francês Henri Coudreau: “Grande ile qui a deux lacs très poissonneux drainés par un émissaire qui débouche à la pointe d’aval de l’ile” (em tradução livre, “grande ilha com dois lagos, repletos de peixes, que vertem suas águas em um rio desaguando na ponta a jusante”). Segundo o relato do viajante, vários seringueiros se estabeleceram ali. Pouco antes da primeira morte do Arapujá, os moradores humanos já eram poucos. Mas a ilha era povoada por animais, plantas, fungos, era também o principal refúgio de lazer da cidade, além de ser seu símbolo.

Uma semana depois de a queimada cessar, num sábado, 9 de novembro, o pescador Lídio Pessoa, 71 anos, foi até a ilha ver o tamanho do estrago causado pela segunda morte. Ele sempre visitava o Arapujá para pegar Murici. “Ainda tinha um muricizal grande. Não tem mais, queimou tudo.” As Seringueiras quase todas acabaram arrancadas no primeiro atentado contra o Arapujá. “Agora, o derradeiro pé que tinha, o fogo matou. Acabou.”

Lídio também encontrou Preguiças e Camaleões queimados. E peixes agonizando num lamaçal no meio do Arapujá, os restos de um lago que a seca fez sumir. “Tinha um lago com peixes, Tamuatá. Secou tudo. A gente vê só eles bubuiando dentro da lama.” A ilha era um berçário de peixes, conta Antonia Melo. E, agora, quantas mortes cabem nas mortes do Arapujá?

A Iguana morreu queimada no Arapujá, uma vida invisível aos olhos da cidade. Foto: SOLL/SUMAÚMA

O crime de Belo Monte

Na primeira vez que a Ilha do Arapujá morreu, quem matou foi Belo Monte, a maior usina hidrelétrica totalmente nacional, erguida com recursos do Estado brasileiro sob o protesto de povos Indígenas, Ribeirinhos, movimentos sociais do Médio Xingu, organizações socioambientais e alguns dos mais reconhecidos cientistas, devido aos seus impactos sobre a floresta, o Rio e seus povos. É chamada de “Belo Monstro” pelos milhares de pessoas que expulsou de terras, ilhas e beiradões do Xingu.

Corria o ano de 2015. Máquinas passaram derrubando tudo. A previsão era que o Arapujá – também chamado de Ilha do Capacete, pelo formato dessa porção insular de terra – fosse engolido com o barramento do rio. Assim justificavam o desmatamento da ilha que dá identidade a Altamira, para que a madeira não apodrecesse submersa, emitindo os gases que produzem o aquecimento global.

“Você pode imaginar o que significa para mim o afogamento da Ilha do Arapujá? Durante 50 anos a contemplei com carinho, sempre que a mirava (Alta-mira) da janela de meu quarto ou do escritório na ‘rua da frente’”, velou a ilha em carta, na época do crime, Dom Erwin Kräutler, bispo emérito do Xingu. “É um pedaço de mim que agora vai para o fundo.”

Dom Erwin Kräutler, em 2015, na varanda do casarão da Diocese do Xingu. Ao fundo, a Ilha do Arapujá. Foto: Lilo Clareto

Dom Erwin nasceu na Áustria e se naturalizou brasileiro. Sua primeira viagem de avião foi também a primeira vinda a Altamira. A Transamazônica ainda não havia cortado a floresta. O avião fez a volta por cima da Ilha do Arapujá para pousar na pista de piçarra que era a Avenida Brigadeiro Eduardo Gomes. Desde aquele sobrevoo, o Arapujá virou parte dele.

O bispo testemunhou a inauguração das obras da Transamazônica e a derrubada da imensa Castanheira, aplaudida pelo ditador Emílio Garrastazu Médici e por sua comitiva na ocasião, em outubro de 1970. Dom Erwin sentiu que aquele seria o começo da derrubada da Amazônia. “De fato, começou aí. E continua, continua, continua.” Mesmo assim, por tudo o que a Ilha do Arapujá representa para a cidade, ele não imaginou que o desflorestamento chegasse até ela.

Em 1980, Dom Erwin Kräutler foi nomeado bispo. Sempre se empenhou na defesa dos direitos humanos e da Natureza. Aos 85 anos, com seus cabelos brancos, lisos, caídos na testa, continua na luta. E o que resta do Arapujá segue pintando um quadro na janela de seu escritório, junto a copas de árvores da orla do cais.

Quando Belo Monte começou a operar, em 2016, não houve inundação da ilha. Mas o desmatamento já havia consumado a primeira morte do Arapujá. “Aí tinha muita madeira de lei. Jatobá, Ipê. Não precisava derrubar. Pra que derrubou?”, questiona, aos 84 anos, Benedito dos Santos, o Bião, vigia no Porto Seis de Altamira. Havia também Ariranhas, avistadas pelo professor de biologia Rodolfo Salm, da Universidade Federal do Pará, no lago no meio da ilha, durante uma aula de campo com seus alunos.

O barramento do Rio Xingu anunciou equivocadamente o alagamento da ilha. À direita, a construção de Belo Monte. Fotos: Lilo Clareto

‘Eu me senti essa ilha’

Passados nove anos, a vida começava a se regenerar. A Ilha do Arapujá crescia em capoeira, mata secundária que nasce teimosamente depois que a floresta primária é retirada. “Era Tiririca, Rabo-de-camaleão, Embaúba”, conta Bião, sobre a paisagem nova e arredia que se formava. Agora veio o fogo e fez cinzas do pedaço de Dom Erwin que não foi para o fundo, mas já havia tombado uma vez.

Lídio Pessoa conta que restos de vegetação derrubados e enterrados durante a primeira destruição foram queimados pelo incêndio recente, formando uma espécie de caieira, um forno em brasa. “A metade da ilha eles derrubaram. Fizeram umas valetas e enterraram aquelas galhadas, cipó. As madeiras boas eles tiraram. Aí, agora, eu fui ver, o fogo acertou a madeira lá embaixo, tava queimando dentro da terra.” Para o professor de biologia Rodolfo Salm, o enterro da floresta derrubada é grave, prejudica a qualidade da água do lago por muitos anos.

“Vamos salvar a Ilha? Do Arapujá! A Ilha? Do Arapujá!”. “Defender a Amazônia é Defender a vida! Defender o Arapujá é defender a vida!” No dia 1o de novembro, terceiro dia de queimada, movimentos sociais fizeram protesto na Praça do Mattias, na orla do cais. Antonia Pereira Martins, liderança da Fundação Viver, Produzir e Preservar, participou do ato. Toinha, como é conhecida, descobriu, em 2020, que estava com câncer de mama. Ao caminhar pelo cais, ela olhava o Arapujá crescendo depois de Belo Monte e fazia um apelo a Deus: “A ilha estava se regenerando, estava voltando, eu queria também que a minha saúde voltasse. Porque eu estava ali no vale da morte”.

Ativistas, artistas e estudantes reunidos para o último grito em protesto pelo Arapujá, com a ilha ao fundo. Foto: SOLL/SUMAÚMA

Toinha tem 61 anos. É uma mulher de estatura média, com cabelos curtos e grisalhos, que retornam depois da quimioterapia que desmatou seu corpo. Em seu entendimento, a ilha havia ficado carequinha igual ela ficou durante o tratamento contra o câncer. “Eu me senti essa ilha.” A conexão de Toinha com o Arapujá é forte. Vê-lo queimar, nas suas palavras, “é uma tristeza enorme”.

No ato, lideranças socioambientais de Altamira manifestaram sua revolta com o poder público. E questionaram a indiferença da população, que seguiu a rotina cotidiana enquanto a ilha queimava por três dias seguidos. “Por que esse crime está invisível à vista do poder público?”, questionou Mônica Brito, professora há mais de 40 anos na cidade e liderança de movimentos sociais pelas políticas de educação e do trabalho e pelo direito das mulheres.

Mônica via o Arapujá como um escudo que protegia Altamira das tempestades e dos trovões. Sem a ilha, “nós ficamos vulneráveis”. Depois de tanta destruição, a Ilha do Arapujá não é mais protetora. Agora “ela está precisando de cuidado”. Para Mônica, a ilha está dizendo que ainda pode sobreviver, mesmo com algumas sequelas. “E nós temos que exigir cuidado, proteção e segurança.”

A liderança Mônica Brito (à esq.) exige proteção para a ilha incendiada. Nos olhos de Antonia Pereira Martins transparece a conexão com o lugar. Fotos: José Felipe Filho e SOLL/SUMAÚMA

Três dias queimando

O primeiro alerta de queimada ao sul da Ilha do Arapujá veio em 30 de outubro, uma quarta-feira. Dez integrantes do 9º Grupamento Bombeiro Militar de Altamira partiram de lancha até o local para tentar conter o fogo. O número de pessoas e equipamentos não foi suficiente para controlar as chamas. O incêndio seguiu avançando e novos focos apareceram no dia seguinte. Dessa vez, o efetivo era de 15 bombeiros, apenas cinco pessoas a mais. A quinta-feira, 31, terminou com labaredas devorando a ilha em frente à cidade.

O grupamento conta com apenas 59 militares para atender a oito municípios da Região de Integração Xingu, numa área de quase 232 mil quilômetros quadrados. Isso significa que cerca de 2,4% do total de bombeiros do Pará são responsáveis por 18,6% do território estadual. Nesse tempo de seca, Altamira recebeu reforço de três bombeiros vindos do Piauí e dez da Bahia, mobilizados pela Força Nacional.

Diante do descontrole do incêndio, em  de novembro a equipe de combate ao fogo cresceu. Foram 50 pessoas, incluindo 27 oficiais do Exército, do 51º Batalhão de Infantaria de Selva. A prefeitura cedeu duas pás carregadeiras e uma retroescavadeira. A balsa que faz a travessia de Altamira para a Gleba Assurini levou os militares e o maquinário para o Arapujá.

“Tá vendo essa parte que tá morta ali na ilha?”, pergunta José Orlando dos Santos, que estava no comando da balsa naquela sexta-feira. “Foi tudo fogo. Lá na ponta tem uma praia, a Praia do Bambu. Eles começaram a apagar lá, mas não conseguiram. Aí veio torando pra cá. Quando viram que não deu jeito, solicitaram que a gente levasse eles lá com as máquinas.”

Da orla do cais, no anoitecer do segundo dia de queimada, dava para ver o fogo alto consumindo a ilha. Foto: divulgação

As máquinas foram usadas para fazer 5 quilômetros de aceiro, técnica que envolve a abertura de um vão sem mata para impedir a propagação do incêndio. Só assim, com uma espécie de estrada separando a ilha queimada da ilha que ainda respirava, no terceiro dia de incêndio o fogo conseguiu ser debelado.

“A ilha recebe uma ação direta dos ventos, que seguem o corredor por cima da planície do rio. Então você tem ali uma vegetação seca que, quando queima, lança no ambiente muita fuligem, fumaça. Esses ventos propagam as centelhas além da linha de combate e vão gerando outros focos, que fazem com que o incêndio crie várias cabeças de fogo”, explica o major Gilmarcos Silva, comandante do 9º Grupamento Bombeiro Militar de Altamira.

No sábado, 2 de novembro, Dia de Finados, o trabalho foi de rescaldo, com apoio de caminhonetes. Ainda houve abertura de alguns aceiros, no entorno de árvores mais frondosas atingidas pela queimada. O monitoramento, segundo o major Gilmarcos, continuou por três dias, com o uso de drones e sobrevoos. Não havia mais focos de incêndio no que restou do Arapujá.

O incêndio só foi controlado com a abertura de um aceiro de 5 quilômetros feito com a ajuda de maquinário. Fotos: Corpo de Bombeiros

Empurrando respostas e responsabilidades

A fumaça não foi embora do céu de Altamira. Alertas de fogo continuaram aparecendo em outras ilhas do Xingu, como a Ilha do Porcão. Segundo o MapBiomas,  entre janeiro e outubro deste ano, a área queimada na região hidrográfica do Xingu foi de 4,5 milhões de hectares. O estado do Pará teve 6,1 milhões de hectares atingidos pelo fogo no mesmo período. Isso equivale a 27% da área queimada em toda a Amazônia Legal, que chegou a 22,6 milhões de hectares. É como se o estado inteiro de Roraima tivesse virado pó. A investigação sobre as causas do incêndio na Ilha do Arapujá custa a andar. Embora a ilha seja área de domínio da União, até hoje não houve apuração do governo federal.

O boletim de ocorrência policial data de 6 de novembro, uma semana após o início da queimada. Como ninguém deu entrada, foi feito de ofício, por um investigador da Polícia Civil. A ocorrência inicialmente caiu para a delegada plantonista. Por não ter havido flagrante e ser preciso abrir investigação, o caso passou para a Delegacia Especializada de Conflitos Agrários.

No dia 8 de novembro, o secretário da Gestão do Meio Ambiente (Semma) de Altamira, Antônio Ubirajara Júnior, disse a SUMAÚMA que a prefeitura ainda não havia feito um levantamento dos danos causados pela queimada e que aguardava a liberação dos bombeiros para enviar técnicos à ilha.

Fomos até o 9º Grupamento Bombeiro Militar de Altamira no dia 13 de novembro. Lá ouvimos dos oficiais que não havia necessidade de liberação. Segundo o comandante, os fiscais da prefeitura poderiam ter ido ao local desde o fim do incêndio. Saímos do grupamento e entramos na Semma. Assim, em segundos. A secretaria é vizinha de muro do Corpo de Bombeiros. Questionamos o secretário sobre a informação vinda do outro lado do muro.

“Eu achei que eles iam fazer um comunicado. Mas se disseram que não vão fazer, segunda-feira eu mando o pessoal lá, pra ver qual foi a extensão dos danos. Na verdade, os danos já ocorreram quando fez Belo Monte, né? Quando eles suprimiram toda a vegetação. O que queimou foi Juquira, foi vegetação secundária”, comentou Ubirajara Júnior.

Só na segunda-feira, dia 18, as autoridades inspecionaram os escombros do Arapujá. A operação envolveu a Semma, a Polícia Civil e o Corpo de Bombeiros. “Houve um foco iniciador no local onde encontramos os restos de uma churrasqueira improvisada com tijolos, uma grelha”, contou o escrivão Smith Veloso, da Deca.

Inspeção no Arapujá identificou uma churrasqueira improvisada, provável origem da queimada. Fotos: Deca de Altamira

Nenhum perito criminal ambiental acompanhou a missão. A Polícia Científica de Altamira conta com apenas um perito ambiental, que estava em operação no município de Novo Progresso, a 817 quilômetros por estrada. Ele retornou e visitou a ilha no dia 22 de novembro, 20 dias depois que  a queimada foi contida. Conforme adiantou a SUMAÚMA, a maior probabilidade é mesmo de fogo feito por pessoas que ali acampavam.

A 7ª Promotoria Ambiental de Altamira, do Ministério Público do Estado do Pará, instaurou notícia de fato, o ponto de partida de uma investigação, para identificar “a provável causa ou causador das queimadas”. O Ministério Público Federal não instaurou procedimento. Diante da quantidade de focos de incêndio no estado, porém, cobrou dos governos estadual e federal medidas urgentes para o combate às queimadas.

Quantas vidas restam?

“As duas tentativas desumanas, destruidoras, de acabar com a história da Ilha do Arapujá foram criminosas”, acusa Antonia Melo, que mesmo após passar por cirurgia cardíaca e colocação de marcapasso, em maio, segue na luta pelo Xingu, que é a luta de sua vida. Na época da primeira destruição testemunhada por Antonia, ela conta que Ribeirinhos já haviam sido expulsos da ilha quando os movimentos sociais souberam que o Arapujá seria desmatado. Houve mobilização em defesa do Arapujá.

Antonia Melo diante dos escombros de sua casa. Ela foi expulsa do bairro pela construção da Usina de Belo Monte. Foto: Lilo Clareto

No dia 30 de agosto de 2015, quando começaram a derrubar a floresta que vestia a lua, movimentos sociais, barqueiros, areeiros que extraíam areia e seixo na região, Ribeirinhos e professores da Universidade Federal do Pará foram até o Arapujá em protesto. Antonia lembra que um engenheiro da Norte Energia disse a ela que a ilha não precisaria ser suprimida, mas que o Ibama havia mandado. Para a liderança, a Norte Energia, empresa responsável pela construção e operação de Belo Monte, também tem culpa. “Fizeram muita coisa errada.”

Antes da hidrelétrica, o pescador Lídio Pessoa morava na comunidade do Paratizão e trabalhava na roça. “Depois que a Norte Energia indenizou pela metade, botou nós pra correr de lá. Não pôde ficar ninguém. E só alagou a beira do rio, pra trás tá tudo lá.” Até hoje ele não se acostumou de, assim como as árvores do Arapujá, ter sido arrancado do próprio chão. Lídio passa o dia na orla do cais, fazendo malhadeira. No início de dezembro, ele voltou à ilha e por lá espalhou sobre a terra arrasada sementes de Jerimum.

A Norte Energia, em nota, diz não ter responsabilidade sobre a Ilha do Arapujá. Pontua que a supressão da floresta não fazia parte das obrigações do licenciamento e reitera ter sido determinação do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), “priorizando a beleza cênica da região”. A empresa alega ter atuado de forma voluntária no controle inicial da queimada na ilha e comunicado à Semma. Segundo o Grupamento de Bombeiros de Altamira, a informação não procede. O secretário de Meio Ambiente do município não lembra de ter recebido comunicado da Norte Energia.

Também em nota, o Ibama nega que o objetivo da retirada de vegetação no Arapujá fosse priorizar a “beleza cênica”. Garante que as supressões estavam embasadas em “estudos ambientais robustos” e que o objetivo era “evitar impactos associados à decomposição orgânica submersa, como a deterioração da qualidade da água e a emissão de gases de efeito estufa”. Ainda segundo o Ibama, o órgão não foi notificado sobre o incêndio e não tem previsão de investigar o caso.

Para Dom Erwin Kräutler, o Ibama deveria abrir um inquérito para investigar as causas do incêndio, mas ele próprio chegou a perguntar para o órgão o número de fiscais ambientais e constatou que, no maior município em extensão territorial do país, a quantidade de servidores é insuficiente. São 12 servidores, entre analistas e técnicos ambientais, e seis estagiários.

Foram muitas destruições testemunhadas por Dom Erwin e Antonia Melo. “E temos agora o resultado, essa mudança clara, inequívoca, essa mudança climática”, afirma o bispo emérito do Xingu. No dia 4 de dezembro, um novo foco de queimada ardeu na Ilha do Arapujá. Foi contido pela chuva que invadiu a noite e varou a manhã seguinte. Quantas vidas a ilha que vestia a lua ainda terá? O coração regenerado da coordenadora do Movimento Xingu Vivo para Sempre sonha com o Arapujá reflorestado, vivo outra vez.

Correção: esta reportagem foi alterada em 11 de dezembro. O texto original dizia que o Ministério Público Federal (MPF) não tem mais ofício ambiental em Altamira. Na verdade, o MPF tem dois ofícios ambientais responsáveis pela região de Altamira e um ofício socioambiental.

O pescador Lídio Pessoa espalha sementes de jerimum pela ilha depois da segunda morte do Arapujá. Foto: SOLL/SUMAÚMA


Reportagem e texto: Juliana Bastos e Guilherme Guerreiro Neto
Edição: Eliane Brum
Edição de fotografia: Lela Beltrão
Checagem: Plínio Lopes
Revisão ortográfica (português): Valquíria Della Pozza
Montagem de página e acabamento: Natália Chagas
Coordenação de fluxo de trabalho editorial: Viviane Zandonadi
Editora-chefa: Talita Bedinelli
Diretora de Redação: Eliane Brum

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