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Mulher participa de referendo sobre mineração e petróleo em Guaiaquil no dia 20 de agosto: seis em cada dez equatorianos foram contra a exploração. Foto: Marcos Pin/AFP

Façamos um brinde em agradecimento ao povo equatoriano, que votou pela vida, por outras espécies e pelas gerações futuras num referendo nacional que forçará a Petroecuador, companhia petrolífera estatal, a desmantelar operações em uma área etno e biodiversa do Parque Nacional Yasuní.

Trata-se de um voto carregado de esperança, mirando o futuro. Um voto que desafia a pressão econômica, a energia baseada em combustíveis fósseis e a pregação do presidente equatoriano, Guillermo Lasso, que insistia que a perfuração de petróleo nessa região amazônica era essencial para as finanças estatais.

No que deveria ser uma lição para o presidente Lula e outros líderes regionais que adoram os combustíveis fósseis, o Estado equatoriano ficará agora com bilhões de dólares de ativos encalhados. O montante foi investido de forma imprudente em um projeto que ignorou as populações locais, a natureza e a emergência climática.

Seis em cada dez equatorianos votaram contra a exploração de petróleo em curso no projeto Ishpingo-Tambococha-Tiputini (ITT), dentro do Parque Nacional Yasuní. Área de imensa biodiversidade, habitada por dois grupos indígenas em isolamento voluntário, os Tagaeri e os Taromenane, o parque é reconhecido pela Unesco como uma reserva mundial da biosfera. Pelo menos 1.300 espécies de árvores nativas e mais de 100 mil tipos de inseto por hectare têm o parque como lar.

Depois de visitar o Yasuní em 2012, escrevi: “Em sua primeira hora na floresta amazônica de Yasuní, muitas pessoas verão mais criaturas do que viram ao longo de toda a vida, incluindo algumas que ainda não foram documentadas pela ciência. Remar pelo riacho Ayango, que sai do tráfego pesado e da poluição do rio Napo para chegar à região mais biodiversa da Terra, é encontrar uma parede de sons, frequentes explosões de cor e combinações inimagináveis de vida (…)”.

Ele deve ser defendido pela Constituição do Equador, que reconhece os direitos da natureza e promete proteger ecossistemas sensíveis de “atividades que podem levar à extinção de espécies, à destruição de ecossistemas ou à permanente alteração dos ciclos naturais”.

No entanto, a descoberta de uma reserva de petróleo avaliada em 7,2 bilhões de dólares dentro do parque levou a um debate feroz. Em 2007, o então presidente, Rafael Correa, propôs à Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) deixar os combustíveis fósseis no solo na área do campo petrolífero Ishpingo-Tambococha-Tiputini, dentro do Yasuní, desde que a comunidade internacional fornecesse metade desse montante ao Estado. Conhecida como Yasuní-In, a proposta desandou rapidamente devido à falta de doações.

Centro da estatal Petroecuador no Parque Nacional Yasuní: extração de petróleo é questionada por ambientalistas e boa parte da população equatoriana. Foto: Rodrigo Buendia/AFP

A produção de petróleo começou em 2016, e o projeto ITT conta agora com 12 plataformas de perfuração e 225 poços, que produzem 54,8 mil barris por dia. Os impactos sobre a população local e o meio ambiente guardam semelhanças com os da mineração ilegal de ouro na Amazônia brasileira. Derramamentos contaminam a terra e a água, estradas são abertas para trazer equipamentos (o que também abre caminho para madeireiros e caçadores), há mais tráfego e poluição nos rios, o ruído e a luz perturbam a vida selvagem e as comunidades indígenas locais se dividem entre aquelas cujos membros estão se empregando na atividade e aquelas que escolheram permanecer vivendo de modo tradicional. De acordo com o Projeto de Monitoramento da Amazônia Andina (Maap), uma iniciativa da organização sem fins lucrativos Amazon Conservation, 689 hectares foram desmatados no Yasuní, principalmente pela indústria petrolífera.

A votação no referendo deve pôr fim à exploração, o que deixa o governo equatoriano com uma dor de cabeça econômica. As exportações de petróleo representam 10% do PIB do Equador e fornecem um terço das receitas do Estado. Agora, a Petroecuador prevê perdas pesadas, da ordem de 16,5 bilhões de dólares, nos próximos 20 anos como resultado do referendo, o que significa que ela não só perderá rendimentos como terá de pagar pelo bloqueio dos poços e pela limpeza do local.


Checagem: Plínio Lopes
Revisão ortográfica (português): Elvira Gago
Tradução para o português: Denise Bobadilha
Tradução para o espanhol: Meritxell Almarza
Edição de fotografia: Lela Beltrão
Montagem da página: Viviane Zandonadi

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