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Assassino de Chico Mendes, Darci Alves virou ‘pastor Daniel’ e se mudou para Medicilândia, onde entrou para a vida política

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De tanto enterrar gente em Medicilândia, município paraense às margens da Transamazônica, um dia o coveiro Adilson Fagundes pegou um caderno e anotou tudo. “Contei: tinha cento e poucas covas de gente desconhecida que vinha de fora para morrer aqui”, diz. “Hoje tem mais.” Segundo Adilson, antes eram os pistoleiros que jogavam corpos por ali na calada da noite, e todos acabavam sendo enterrados na cidade. Vítimas que quase sempre haviam tombado à bala por causa de conflitos de terra, explica. Hoje, são os traficantes. No muro do cemitério de Medicilândia dá para ver as pichações com os nomes de facções criminosas oriundas do Sudeste do país e que atuam também na Amazônia brasileira. CV, o Comando Vermelho. CCA, o Comando Classe A – este surgiu em Altamira e é aliado do PCC, o Primeiro Comando da Capital.

Medicilândia, como o coveiro, acorda cedo. Às 6h30, em meio a uma densa névoa, as portas de ferro das lojas vão se abrindo e as ruas são tomadas por motocicletas de baixa cilindrada. Às 7 horas, há motociclistas por todos os lados, levando homens, mulheres, crianças, adolescentes e velhos, mas ninguém usa capacete. A Polícia Militar passa e ignora. Segundo a Secretaria Nacional de Trânsito, Medicilândia tem cerca de 7,5 mil veículos – 935 caminhonetes, 1.011 carros e quase 5 mil motos. Aos poucos, uma película poeirenta se forma sobre o asfalto carcomido, e a cidade antes encoberta pela neblina agora está debaixo de pó, um pó alaranjado que cobre as calçadas, as ruas, os eletrodomésticos expostos nas lojas populares. Às 8 horas, o sol é escaldante.

Com 27 mil habitantes, Medicilândia tem mais de 218 mil bois e vacas, que são homenageados por uma estátua na entrada da cidade (no fundo, à esq.)

A cidade transamazônica – e uma de suas duas avenidas centrais – foi nomeada em homenagem a Emílio Garrastazu Médici (1905-1985), cuja Presidência, de 1969 a 1974, se transformou no período da ditadura empresarial-militar (1964-1985) em que mais civis foram sequestrados, torturados e executados no Brasil.

Medicilândia abriga 27 mil habitantes (só 6,6% deles estão ocupados), 218.779 bois e vacas, 4.560 cavalos e éguas, 1.502 carneiros e ovelhas, 1.399 suínos e 97 cabras e bodes. É destino de gente que chegou lá para morrer, como conta o coveiro, mas também de gente que parou por lá depois de matar. E de Darci Alves Pereira, de 56 anos, o assassino confesso do ambientalista, sindicalista e seringueiro Chico Mendes, um crime ocorrido em 1988 que colocou holofotes internacionais sobre o estado amazônico do Acre.

Há 34 anos, Darci e seu pai, o grileiro Darly Alves, acusado de ser o mandante do crime, foram condenados a 19 anos de prisão. Ambos passaram pouco mais de seis anos na cadeia. Desde então, Darci vivia em Medicilândia incógnito por trás de um nome falso – Daniel Dorzila de Oliveira (que pegou emprestado de um parente, hoje pré-candidato a prefeito de Epitaciolândia, no Acre). Apresenta-se como “pastor Daniel”, criou uma igreja evangélica e tenta se infiltrar na política. Pré-candidato a vereador e ex-presidente municipal do PL, sigla do extremista de direita Jair Bolsonaro, foi destituído do cargo por Valdemar Costa Neto em fevereiro, depois de o site ((o))eco revelar que o líder do PL em Medicilândia e o assassino confesso do maior ambientalista brasileiro de todos tempos eram a mesma pessoa. Em 5 de abril, Darci foi expulso do partido.

Nesta reportagem, SUMAÚMA reconstitui a chegada de Darci a Medicilândia e sua vida na cidade. O homem que em 1988 reconheceu ter matado Chico Mendes se tornou rico, negociante de gado, cacau e terras. E tenta se infiltrar na política numa cidade onde, em 2022, Bolsonaro teve 67,3% dos votos. Lula, 32,7%.

Depois de preso, Darci (acima) tornou-se evangélico. Em Medicilândia, já pastor, abriu uma igreja. Fotos: Josemar Gonçalves/Agência O Globo e Reprodução/Facebook

A CIDADE

Na entrada do município, um pórtico arqueado de metal azul mostra a frase: “Eu amo Medicilândia”. No lugar do verbo, um coração vermelho. A cidade surgiu quando o ditador Emílio Garrastazu Médici, a partir de 1971, implementou o Programa de Integração Nacional (PIN), um conjunto de “obras faraônicas”, como chamaram os jornalistas à época, cuja primeira prioridade era a construção da Transamazônica. Em 1973 apareceram as casas do vilarejo rural pensado para abrigar parte de milhares de nordestinos que chegavam à região com a Transamazônica.

As motoniveladoras amarelas avançavam levando árvores, raízes e animais. A ordem era trocar tudo por cana-de-açúcar, pastos e bois. Vieram também a grilagem de terras, a expulsão de famílias Ribeirinhas, o genocídio de povos originários e a corrupção de policiais e juízes.

“Integrar para não entregar” e “Terras sem homens para homens sem terra” eram dois dos lemas do PIN – ainda que os gringos vistos como ameaça à soberania nacional fossem os mesmos a financiar a incursão na floresta com empréstimos milionários. E ainda que as terras no entorno da Transamazônica não fossem sem homens. Eram habitadas havia séculos por seringueiros e Beiradeiros – e havia milênios por Indígenas.

Médici aproveitava o Programa de Integração Nacional para acobertar o fato de que os militares torturavam, matavam e davam fim aos corpos dos integrantes da Guerrilha do Araguaia e de camponeses da região. Só mais de 40 anos depois um memorando da agência central de inteligência estadunidense, a CIA, descoberto pelo professor Matias Spektor, da Fundação Getúlio Vargas, revelou que 104 presos foram executados sumariamente nas dependências do Exército no último ano do governo Médici, 1973, mesmo ano em que começou a se estabelecer a vila de Medicilândia, elevada a cidade em 1988.

A cidade surgiu na década de 1970, pensada para abrigar parte dos milhares de nordestinos que chegavam à região para a abertura da Transamazônica

O CRIME

Também em 1988, às 18h30 de 22 de dezembro, uma quinta-feira, Francisco Alves Mendes Filho, o líder seringueiro Chico Mendes, jogava dominó com um cabo e um soldado da Polícia Militar, seus seguranças enviados pelo governo do Acre. Depois do jogo, levantou-se em sua casa de madeira em Xapuri, a 187 quilômetros da capital, Rio Branco, e saiu para tomar banho no chuveiro do quintal. Darci, aos 21 anos, estava escondido atrás de um coqueiro e armado com uma espingarda calibre 12, conforme confessaria quatro dias depois. Às 18h45, ao abrir a porta, Chico Mendes foi atingido por 42 caroços de chumbo no lado direito do peito.

A notícia percorreu o mundo. Três anos antes, Chico Mendes havia liderado o Encontro Nacional dos Seringueiros, desenhando os primeiros traços da União dos Povos da Floresta, aliança que pela primeira vez uniria seringueiros e Indígenas, mas também castanheiros e Ribeirinhos. Chico agregou todos que desejavam a floresta em pé – contra os desmatadores agremiados na União Democrática Ruralista, a UDR. Seringueiro e sindicalista, denunciou na Organização das Nações Unidas a devastação ambiental na Amazônia. Seu legado também inclui a luta pelas reservas extrativistas, as Resex, criadas pelo governo federal após sua morte e que hoje somam milhões de hectares em 96 unidades espalhadas pelo país.

Chico Mendes foi assassinado ao sair para tomar banho no chuveiro do quintal de sua casa, em Xapuri, no Acre. Hoje, o local virou museu. Fotos: Homero Sérgio/Folhapress e Odair Leal/Folhapress

Treze dias antes de ser morto, Chico Mendes anunciara seu iminente assassinato, pois vinha recebendo ameaças. Disse que entre os que tinham interesse na sua morte estava o fazendeiro Darly Alves. Em uma entrevista ao Jornal do Brasil em 9 de dezembro de 1988, afirmou que Darly e seu irmão mais velho, Alvarino, o tinham ameaçado de morte. Enviou cartas às autoridades avisando. Após a desapropriação do seringal Cachoeira, área da qual Darly Alves dizia ser dono e onde pretendia colocar gado, Chico entrou de vez na mira do grileiro. Três meses antes de ser assassinado, ele buscou o histórico criminal de Darly no Paraná e o fez chegar ao delegado Mauro Sposito, então superintendente da Polícia Federal no Acre. “Eu era correspondente do Estadão no Acre. Fiz uma matéria sobre o Chico dizendo que estava sendo alvo de um complô”, conta o repórter acreano Altino Machado, de 62 anos, que cobriu o caso. E segue: “Chico pediu providências, e ele [Sposito] não fez nada. Foi omisso”, lembra Machado.

Sposito, hoje aposentado, foi coordenador de operações especiais de fronteira e superintendente da PF no Amazonas por oito anos. Questionado por SUMAÚMA se era próximo de Darly e de pecuaristas da região, respondeu: “Não tinha proximidade nenhuma [com Darly]”. “Conversa fiada.” Afirmou ter recebido à época uma carta precatória contra Darly do bispo Moacyr Grechi, amigo de Chico Mendes. “Era endereçada ao juiz de Xapuri. Nada a ver comigo”, diz o delegado. “Um documento que veio aberto, endereçado a outra pessoa. Falei: ‘Olha, não posso dar seguimento a isso porque está endereçado ao juiz de Xapuri’.” Sposito afirmou ter visto Darly uma só vez. “Estava na BR-317 na entrada de Xapuri, quem me indicou que era o Darly foi o sobrinho do bispo Moacyr. Foi a única vez que o vi.”

Quatro dias depois do assassinato, Darci, filho de Darly, se entregou à polícia. “A polícia não acredita que ele seja o autor do crime. Supõe que se entregou para afastar do pai os policiais”, registrou a capa do Jornal do Brasil no dia seguinte. Durante a reconstituição do crime feita à época pela polícia, que durou quatro dias e resultou num vídeo de seis horas, Darci forneceu detalhes. A posição em que estava (sentado), se sentia nervosismo (“Nervoso deu, sim senhor. Se não tivesse dado nervoso, eu não tinha feito isso”). O sino da igreja, que ouviu enquanto estava de tocaia no quintal. A maneira como a luz bateu no rosto de Chico. A lanterna que a vítima segurava. Peritos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), além de policiais paulistas, foram convocados para o trabalho, que o juiz do caso, Adair Longuini, considerou “impecável”, registrou o jornalista Zuenir Ventura no livro Chico Mendes – Crime e Castigo. Ficaram convencidos de que Darci havia sido o autor do disparo. “Foi eu mesmo que fiz. O homem vivia ameaçando meu pai. Todo dia na imprensa, no rádio. Todo dia”, disse o assassino confesso. “Disparei a arma e saí correndo.”

A SUMAÚMA, Darci negou ter assassinado Chico Mendes e prometeu revelar “a verdade” em um livro. “Eu não matei Chico Mendes. Não matei”, diz. “Posso te garantir com toda certeza que não fui eu que puxei o gatilho, não. Eu me apresentei como se fosse criminoso para tentar confundir as autoridades. Nessa época, foi alguém que conversou comigo e acabou me convencendo.” Darci não quis entrar em detalhes. “A gente sonha aí pro futuro fazer um livro. Uma visão mais ampla e abrangente. Se você quiser escrever o livro, depois você me procura. Tem tendência de dar uma grande repercussão e até filme.” Questionado se conhecia outro autor do crime, ele riu. “Essa daí é uma pergunta que não quer se calar, né?”, afirmou. “Quem sabe eu poderia ir mais longe.”

Edição do Jornal do Brasil de 23 de dezembro de 1988 relata o assassinato de Chico Mendes. No destaque, a entrevista em que ele, dias antes, contava ter sido ameaçado de morte

A TESTEMUNHA

A confissão de Darci em 1988 tornou-se mais crível com o depoimento de Genésio Ferreira da Silva, testemunha-chave do processo. Dos 7 aos 13 anos, ele viveu na Fazenda Paraná, nos arredores de Xapuri, onde a morte de Chico Mendes foi tramada. Morava com a irmã, mulher de Oloci, irmão de Darci por parte de pai, e mais um entre os mais de trinta filhos de Darly. “[Oloci] era muito ignorante e violento, já tinha batido nela [irmã de Genésio] só porque chegou do campo e o almoço ainda não estava pronto. Falava muito em matar”, escreve Genésio em seu livro Pássaro sem Rumo: uma Amazônia Chamada Genésio, publicado em 2015 pelo Instituto Vladimir Herzog.

Genésio contou que Darly costumava andar com um revólver 38 na cintura, “ou então com uma 765 com bala de aço capaz de atravessar uma coluna de concreto”. Com o tempo, Genésio foi se enturmando com a família Alves e ganhou uma arma de Darly. O grileiro vivia com quatro mulheres e era o mais temido da região, com fama de pistoleiro e garanhão.

Depois de ter um caso com uma prostituta no Paraná, Darly levou o filho de ambos, Darci, ao Acre, onde o menino foi criado pela madrasta Natalina, uma das mulheres do pai. Ela inventou um apelido para o garoto: Aparecido, porque apareceu de repente. “Ele era maltratado pela velha Natalina e pelos três filhos mais velhos, Oloci, Darlizinho e Vera, seus irmãos por parte de pai”, conta Genésio no livro. “Ele se sentia humilhado. (…) Era nervoso, era aquele tipo de pessoa revoltada. O problema dele era a ausência da mãe e de uma irmã que não conhecia nem por foto. Por isso era uma pessoa rebelde e perigosa, muito perigosa, e se considerava o filho bastardo da família. (…) Uma vez me disse que até os 12 anos de idade foi escravizado e humilhado por Natalina e seus três filhos mais velhos, que não aceitavam ele como irmão. Dizia que o pai dele era bandido; dizia também que tinha vez que dava vontade de matar o Oloci, a velha Natalina e seu pai. Às vezes chorava e se dizia injustiçado pela vida e pela família que tinha.”

Logo Genésio conheceu o lado obscuro de Darci. “Darci, Oloci, Amadeu e Serginho [primos de Darci, conhecidos como ‘mineirinhos’] tinham assassinado dois estudantes bolivianos que levavam na bagagem uma média de 1 a 2 quilos de cocaína pura. Eles mataram a pedido do fazendeiro Darly”, escreveu. Genésio viu o dia em que os bolivianos passaram e não voltaram. Ouviu quatro tiros. Depois, viu Darci com um pacote na mão, recheado com um pó branco. “Hoje reconheço que era cocaína”, disse Genésio a SUMAÚMA. Atualmente com 56 anos, ele viveu boa parte deles em clínicas para alcoólatras.

Genésio lembra que um peão da fazenda grilada de Darly, Raimundo Ferreira, quis namorar uma das filhas do pistoleiro. Quando pediu a mão dela em casamento, Darly não deu. “Raimundo também brigou com Oloci, aí mataram ele”, contou Genésio, ainda adolescente, em entrevista a Zuenir Ventura. “Quem matou?”, perguntou o jornalista. “O Oloci, o Aparecido e um primo do Oloci, o Rildo”, respondeu o menino. “Eu fui lá, vi o homem com a orelha cortada, o nariz e um beiço.” Duas décadas depois, em seu livro, Genésio rememorou uma conversa sobre Raimundo. “Darci disse que mataram ele aos poucos, torturando (…) Que cortaram a orelha dele, o nariz e os lábios.”

Genésio Ferreira da Silva, única testemunha do assassinato de Chico Mendes, foi obrigado a sair de seu estado para não ser morto. Foto: Bruno Kelly/Amazônia Real

A SUMAÚMA, Darci desconversou: “Isso aí eu não tenho nem o conhecimento aonde você quer chegar com esse assunto aí, porque eu não tenho nada a ver com isso, com boliviano. Eu não conhecia esses bolivianos, ouvi falar só. Chegou a correr um processo lá, cheguei a ser ouvido, mas não tinha envolvimento. E Raimundo, eu não sei nem quem é esse Raimundo, nunca nem ouvi falar”.

Genésio também se lembra de ter ouvido quando Darly anunciou que mataria Chico Mendes. “Ele [Darly] disse que o Chico Mendes não ia ter nem mais um ano de vida. Antes de matar, ele falou que ia pedir a mão de Chico Mendes a cumpadre só pra matar. Ele ia chamar o Chico Mendes lá para ser cumpadre e aí ia matar ele”, relatou o adolescente Genésio, na entrevista a Zuenir, em 1988. A SUMAÚMA, ele repetiu tudo o que disse à época e escreveu em livro depois, detalhando como o assassinato de Chico Mendes foi tramado.

FAMÍLIA DE MATADORES

O método traiçoeiro de Darly seguia o exemplo do patriarca da família Alves, Sebastião Alves. Pai de Darly, ele era um temido agricultor em Minas Gerais na década de 1950. No livro Nova Jerusalém, a Terra Comprometida, o jornalista Nicolau Farah descreve a forma como Sebastião atuava: “Ao executar alguém, [Sebastião] se aproximava da vítima como quem não quer nada e, de repente, traiçoeiramente, cravava seu punhal na barriga da pessoa”.

Sebastião criara Darly e seus irmãos como Darly depois criaria alguns de seus filhos, transformando-os em matadores. Em 1958, Darly e seus irmãos Alvarino e Ari, além do pai, Sebastião, mataram o tropeiro Manoel Pinto, o Nequinha Doca, e seu filho de 15 anos, em Pocrane, município mineiro. Doca levou 16 tiros; seu filho, mais seis. “Na fúria, os Alves mataram até o cavalo que o rapaz montava”, registrou o Jornal do Brasil em 27 de dezembro de 1988. Mais tarde, moradores da região disseram à Justiça que os Alves “costumavam contar como feitos heroicos os crimes que cometiam, para infundir respeito” e “matavam porque achavam bom matar”. Denunciados pelo Ministério Público de Minas Gerais em 1963, os Alves fugiram para Umuarama, no Paraná.

Lá, voltaram a matar. Em 1969, o comerciante Ângelo Urizzi, um judeu de origem austríaca com quem Darly mantinha uma disputa de terras, foi executado por um pistoleiro. Em 1973, o filho de Urizzi, Acir Urizzi, foi assassinado. Em 1974, Darly fugiu de novo, dessa vez do Paraná para Xapuri. Mais de 20 anos depois, Darly foi condenado pelo assassinato de Acir Urizzi. O de Ângelo ficou impune.

Foi a papelada sobre esses crimes que Chico Mendes trouxe à tona, com a esperança de ver Darly preso no Acre. Não adiantou. Em dezembro de 1988, Genésio, a testemunha-chave, ouviu o seguinte diálogo na Fazenda Paraná, segundo contou em seu livro: “E aí, já está tudo pronto pra dar fim na vida do Chico?”, perguntou Darly a Darci e seu primo, Serginho. “Já, sim senhor”, disse Serginho. “E a tocaia, foi bem planejada como eu pedi?”, continuou Darly. “Está tudo do jeito que o senhor pediu”, respondeu Darci.

“Como a minha cama ficava colada à varanda, que tinha brechas na parede, eu ouvi toda a comunicação entre eles”, escreveu Genésio. Segundo seu relato, Darly teria dito: “A vaca já tá amarrada e o vinho no barracão pra nós comemorarmos a morte daquele infeliz”. O grileiro pediu para ver a arma. Em seguida, apanhou a chave do carro e entregou a Darci: “Boa sorte”. No livro, Genésio também afirma que Darci, mais tarde, ganhou 150 cabeças de gado como prêmio pelo assassinato.

Dois anos após o crime, Darly (à esq.) e Darci foram condenados a 19 anos de prisão. Foto: Antônio Gaudério/Folhapress

Após ter confessado o crime, Darci mudou seu depoimento duas vezes: primeiro, disse que não estava em Xapuri no dia do assassinato; depois, negou a autoria. Segundo a acusação à época, encampada pelo advogado e futuro ministro da Justiça Márcio Thomaz Bastos (que morreu em 2014), tratava-se de uma estratégia para livrar o pai da acusação de mandante.

“É, essa dúvida ficou rolando”, diz Elson Martins, 85 anos, outro repórter que cobriu o caso. “O Darci confessou daquele jeito introvertido, dava pra duvidar de sua capacidade de matar um líder como o Chico Mendes. Ele tinha muita vontade de se afirmar diante do pai, Darly, porque este, sob pressão da família, o considerava um bastardo”, prossegue. O jornalista conta que, na época, havia suspeitas sobre a participação da União Democrática Ruralista, um grupo formado por latifundiários e políticos, na morte de Chico Mendes.

Em 1990, Darly e Darci foram condenados a 19 anos de prisão pelo assassinato do líder seringueiro.

PRISÃO E FUGA

Em fevereiro de 1993, depois de serrar grades e escapar da prisão no Acre após quatro anos de pena, Darci e Darly se refugiaram na região de Medicilândia. Darly se apresentava como João Mato Grosso. Darci passou a ser Daniel.

“Todo mundo conhecia ele [Darly] como João Mato Grosso, vindo de Mato Grosso e não do Acre, e o Darci era o Daniel”, afirma Ademir Venturin, presidente da Cacauway, uma fábrica de chocolates ligada à cooperativa de produtores de cacau de Medicilândia. Raimundo Xavier, presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município, lembra de ver Darci chegar à região. “Era ele e o pai dele, Darly, que aqui era conhecido como João Mato Grosso. Ninguém sabia o nome dele direito”, diz Raimundo. “Ele saiu comprando terra por aí.”

A SUMAÚMA, Darci confessou ter usado nome e documento falsos. “Esse nome de Daniel, apelido de Daniel, foi quando eu saí do Acre. Eu tinha fugido da cadeia e um irmã… um parente meu me forneceu o documento dele para eu sair. Cheguei aqui com esse nome”, diz Darci. “Não quis mandar parar de chamar eu desse nome. Mas meus documentos tudo é Darci Alves Pereira. Aqui na região, se perguntar por Darci, pouca gente sabe quem é Darci.”

Darci chegou a Medicilândia com o nome de Daniel. Nas redes sociais ele compartilha mensagens de direita e vídeos de seus cultos. Foto: Reprodução/Facebook

Em junho de 1996, várias viaturas da Polícia Federal avançaram em alta velocidade pelo Travessão do quilômetro 130 da Transamazônica, em Medicilândia. “A polícia foi inteligente, tinha passado antes tirando sangue dos moradores, dizendo que era para testar a malária”, lembra um morador, que deu entrevista na condição de anonimato. “Mas não era malária. Era DNA. Tiraram o sangue de várias pessoas até tirarem o sangue deles. Descobriram que realmente eram eles.” Os policiais foram à porta de Darly antes das 6 da manhã. Darci, que morava na casa em frente, fugiu. Seria preso cinco meses depois, em Guaíra, no estado do Paraná, na fronteira com o Paraguai.

Pai e filho cumpriram o resto da pena no presídio da Papuda, em Brasília, até que em 1999 Darly foi para o regime domiciliar e Darci para o semiaberto.

Darly rumou para o Acre. Aos 88 anos, vive numa casa em Rio Branco, com a ajuda de uma cuidadora. Gasta as tardes visitando suas fazendas ou ensinando netos a atirar. A família está rica. Oloci tem duas grandes fazendas no Acre. Outras estão em nome de outros filhos de Darly. Na Fazenda Paraná, criam-se gado e Tambaqui. Apesar disso, Darly teve de assistir a tragédias em família. Um filho matou, com um tiro na cabeça, uma das mulheres do pai, em 2008. Um neto entrou para o Comando Vermelho, apadrinhado por um dos criminosos que, neste ano, fugiu da Penitenciária Federal de Mossoró. “Muita gente teme eles ainda. O pessoal ouve as histórias e não quer ir lá na fazenda trabalhar”, diz Genésio a SUMAÚMA.

Enquanto isso, Darci voltou a Medicilândia e começou a se transformar em outro personagem.

PASTOR DANIEL

Depois da área urbana de Medicilândia, o asfalto da BR-230, a Transamazônica, dura poucos metros e acaba. Dá lugar a uma estrada torta e esburacada, intrafegável na chuva. A 46 quilômetros do centro, na frente de uma Terra Indígena e de uma base da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), é a região do “Travessão do km 130”. A 16 quilômetros da rodovia, depois de quatro igarapés, duas igrejas evangélicas e uma dezena de pequenas casas de madeira, há uma ampla construção de alvenaria encravada em um terreno de 400 hectares, com pé-direito alto e dezenas de placas solares no telhado. O trajeto até a porteira é cercado por eucaliptos. No alpendre há uma bandeira do Brasil. Num canto, uma câmera de segurança e uma plaquinha: “cão bravo”. Dentro, uma caminhonete bordô com tração 4×4, cujo para-choque exibe um adesivo de Jair Bolsonaro. É a casa de Darci.

A abertura da Transamazônica arrancou árvores e animais para dar lugar a pasto. Trouxe também a grilagem e a expulsão de Ribeirinhos e Indígenas

“O Travessão tem uma fama de esconder quem não presta”, diz um morador da região, também sob anonimato. “Quem faz suas porcarias vem se entocar aqui. A gente nem sabe direito quem é.” Um dos proprietários de terra ali, diz o morador, é Regivaldo Galvão, o “Taradão”, condenado a 25 anos de prisão como mandante do assassinato da missionária estadunidense Dorothy Stang em 2005. “Se tu mexe nesse Travessão, tem muita merda aqui.”

A partir de 2018, segundo vizinhos, Darci juntou um grupo de pessoas e fundou uma igreja evangélica chamada Missionários da Última Hora, uma extensão da Assembleia de Deus. “Ele era católico. Depois que foi preso, optou por outra religião e virou pastor”, conta Venturin, da cooperativa de cacau. Darci construiu uma capela nos fundos do seu lote e começou a levar seguidores aos rios, para batizá-los. “As pessoas acreditavam na recuperação, na santificação dele”, relata outro vizinho. “Mas foi por um período curto. Do jeito que subiu, caiu.”

Os fiéis começaram a deixar a igreja, um a um. “Quando viram o modo dele de tratar as pessoas, a arrogância, o poderio econômico, começaram a sair devagarinho, até sair a última pessoa”, lembra um morador. “Viram que ele não era pastor.” A igreja foi fechada. Hoje, Darci está montando uma nova comunidade religiosa em Altamira, um dos polos regionais da Transamazônica, a 85 quilômetros de Medicilândia. “Ele bota camisa de pastor, Bíblia embaixo do braço, mas a gente sabe que o coração dele não é… As atitudes ambientais não mostram que ele protege a Amazônia.”

Periodicamente, Darci conduz cultos evangélicos na fazenda de sua família no Acre, a mesma Fazenda Paraná onde se tramou contra Chico Mendes. O próximo culto está marcado para agosto.

“Nós viemos saber que ele estava por aqui lá pelos anos 2000. Até então, você ouvia falar em pastor Daniel e ninguém imaginaria o que ele tinha feito”, diz o agricultor Moisés Rodrigues. “Mas os moradores mais antigos sabem que o assassino do Chico Mendes sempre morou aqui”, afirma ele.

“Muita gente aqui não sabia”, comenta uma vendedora de uma loja de chocolates. “Conheci a irmã do Chico Mendes, e ela me contou que ele era daqui.” A professora Renata Xavier, que leciona em Medicilândia, concorda. “Só alguns sabiam. Difícil de ver. Não era muito de frequentar a cidade.”

Município vizinho a Medicilândia, Brasil Novo também ganhará uma estátua em homenagem ao gado. Na região, os pastos dividem espaço com pés de cacau

Darci vive com a mulher, Deusimar Vidal, e um filho menor de idade. Outros quatro irmãos, filhos de Darly, moram por perto. No lote há 200 cabeças de gado, tratores, máquinas e 60 mil pés de cacau, em cuja lavoura trabalham ao menos seis meeiros. As terras estão registradas em nome de Deusimar no Cadastro Ambiental Rural (CAR), um registro público eletrônico autodeclarado, com localização em Uruará. No cartório do município, não há registro do imóvel. No cartório de Medicilândia, uma funcionária informou que há matrículas e registros em nome de Deusimar, mas não soube precisar a localização dos imóveis. Darci afirma que comprou as terras legalmente: “Nós não roubamos nem invadimos terras de ninguém. Foi feito financiamento nelas. Escritura pública, registro e memorial da terra, aqui [no Travessão do km 130] só eu que tenho. Paguei a dívida do Incra na época”, disse a SUMAÚMA.

Darci também vendeu gás na vizinhança e foi o primeiro a instalar uma antena de internet no Travessão. De cada morador que queira se conectar à internet, Darci cobra 7 mil reais, fora as mensalidades. “O capitalismo ali é forte. Ele não dá ponto sem nó, o negócio dele é a lucratividade”, afirma um vizinho.

Na lista pública de infratores ambientais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) aparecem ao menos cinco familiares de Darci – Darly (pai), Oloci (irmão), Guinaldo (irmão), Gentil (primo), além de Deusimar, sua esposa. Em Uruará, município vizinho de Medicilândia, ela foi multada em 900 mil reais por desmatar 183 hectares de floresta nativa. A área foi embargada pelo Ibama. Em Medicilândia, uma das 25 cidades mais desmatadas do país, a devastação da floresta cresce junto com o número de bois. Em 2019, eram 181 mil animais no município. Em 2022, quase 219 mil – um salto de 21% em quatro anos. O cacau também avança sobre a mata.

As amêndoas cultivadas por Darci vão parar no estoque de multinacionais que as distribuem no mercado interno e também ao exterior por meio da estadunidense Cargill e da belga Barry Callebaut, as maiores compradoras de cacau no município. Na Cargill, contudo, Darci foi bloqueado como fornecedor. “Foi muito por uma questão de disposição política que eles não quiseram mais [comprar cacau de Darci]”, afirma um ex-funcionário da Cargill, então responsável pelo compliance socioambiental da empresa, que preferiu não se identificar.

“A Cargill comprava o cacau dele. E ainda compra, mesmo que indiretamente, por meio de intermediários”, diz a produtora rural Josiane Araújo, candidata do PT à prefeitura de Altamira. Questionado por SUMAÚMA se foi impedido de vender à Cargill por ter sido condenado pela morte de Chico Mendes, Darci respondeu: “Eu tenho uns papel lá, mas não quero entrar nesses detalhes, não. A gente tem um processo em andamento para certificar nosso cacau, mas enfim… É uma questão deles lá fazer isso…”. A Cargill afirmou, em nota, que Darci foi fornecedor da empresa por apenas um mês, em 2018, e está bloqueado “por não se adequar às políticas de fornecedor” da empresa. A Callebaut foi procurada por e-mail e Instagram no dia 16 de maio e não respondeu até a conclusão desta reportagem.

Em 2022, os produtores de cacau de Medicilândia arrecadaram 693 milhões de reais com a venda de amêndoas. As plantações no município chegaram a 44 mil hectares naquele ano, e a colheita somou 51 mil toneladas de amêndoas, segundo o IBGE. A área de cultivo de cacau é quatro vezes o espaço reservado às bananas, 441 vezes o tamanho das plantações de açaí e mais de 8 mil vezes as roças de guaraná. A terra fértil da região, a idade dos cacaueiros (que quanto mais velhos mais produzem), as secas na Costa do Marfim (maior produtor mundial da fruta) e o avanço da vassoura-de-bruxa na Bahia transformaram o cacau de Medicilândia no mais disputado do mundo, e a cidade, na maior produtora de cacau no Brasil. O preço saltou de 11 reais para quase 70 o quilo – valor jamais visto na região.

Antiga fábrica de açúcar próxima a uma plantação de cacau: Medicilândia é conhecida como a capital nacional do cacau

Foi ideia do senador Zequinha Marinho (Podemos, do Pará), aliado de Jair Bolsonaro, propor em 2020 um projeto de lei para conceder a Medicilândia o título de “capital nacional do cacau”. O parlamentar também defende a redução dos limites da Terra Indígena Cachoeira Seca, medida de alto interesse de madeireiros, grileiros e fazendeiros da região. Darci postou em suas redes sociais fotos em que aparece abraçado com Marinho e outros parlamentares de extrema direita, como o presidente do diretório paraense do PL, delegado Éder Mauro, que já confessou ter matado “muita gente”. Em nota a SUMAÚMA, a assessoria de Marinho afirmou que o senador é de outro partido e que “não existe nenhuma relação com o senhor [Darci] alvo de apuração deste veículo de imprensa”. Sobre os projetos de Marinho, o texto enviado para a reportagem diz que o parlamentar “luta pelos interesses do Pará”.

Darci também se interessa por política, como alguns de seus familiares, entre eles o irmão Guinaldo, ex-vereador em Xapuri e novamente pré-candidato este ano. Em 2022, Darci e sua mulher foram ao cercadinho do Palácio da Alvorada, em Brasília, para um encontro com Bolsonaro. “Não concordo que homem seja casado com homem, que mulher seja casada com mulher”, declara Darci, que se filiou ao PL em fevereiro de 2022. “Vou estar no maior evento do conservadorismo lá em [Balneário] Camboriú, Copac, né?” [CPAC, organizado por Eduardo Bolsonaro].

Após a eleição de Lula em 2022, Darci e Deusimar estiveram nas manifestações de bolsonaristas que pediam golpe militar. Seus vizinhos notaram que, na época dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, Darci vendeu várias cabeças de gado no Travessão. “Ele é um dos patrocinadores do 8 de janeiro”, afirma um vizinho. “Dizem por aqui que apoiou as manifestações pró-golpe com 60 mil reais. Outros falam em 30. O fato é que nesse período pós-eleição eles venderam muito gado.” Darci nega. “Isso aí é mentira. Quem falou isso, não sei de onde você puxou isso… Eu não ia fazer isso. Se eu tiver de ajudar alguém é para uma obra de Deus, mas pra essas questões políticas aí, não. Isso aí eu jamais faria.”

No início de abril, a mando do presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, Darci foi desfiliado do partido “em razão de sua conduta pessoal reprovável”, segundo a ata da reunião do partido em Medicilândia que decidiu pelo seu afastamento.

“Acredito que o Valdemar tomou uma decisão equivocada”, diz Darci. “Sou mais limpo que ele. Se puxar a ficha hoje, não tenho processo correndo contra mim. Ele me impede de estar no partido só por causa do meu passado, lá atrás? Paguei o que devia para a Justiça, pra sociedade. Nada me impede de ser um cidadão comum. Tenho o direito de participar, e a sociedade que dá a resposta. Como a sociedade medicilandense tá me vendo?”, questiona.

Darci Alves Pereira foi destituído da presidência do diretório municipal do PL e expulso do partido depois que seu passado veio à tona. Foto: Reprodução/Instagram

Com medo, segundo um morador do Travessão. “A gente não gosta de falar muito desse povo”, diz. “Eles impõem medo. São pessoas poderosas, a gente tem medo deles. O Daniel pode não pegar uma pistola e dar o tiro, mas quem está do lado dele? Gente grande, desde aqui do Pará, no Acre, em Brasília. A filha dele é advogada grande em Brasília. Eles tão ligados a tudo quanto é gente grande.”

Nos grupos de WhatsApp da zona rural de Medicilândia, as notícias sobre a destituição de Darci do cargo de líder municipal do PL se espalharam. Darci ficou calado e chegou a sair de alguns grupos. Uma loja de produtos para o agronegócio que ele mantém na cidade foi boicotada por moradores. “Disseram nos grupos: ‘Não compre lá!’. Ele [Darci] justificou dizendo que a loja era da sobrinha. A loja passou uma semana sem movimento”, lembra Josiane Araújo.

Há, contudo, quem ache injusto o destino de Darci no PL. “Ele fez o que fez, pagou e agora é livre”, afirma Walter Oliveira, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais de Medicilândia. “Eu o conheço, é gente boa. Esteve na nossa assembleia no sindicato. Está tentando continuar a vida. Se nós acreditamos que existem direitos humanos nesse mundo, o Seu Darci é um exemplo disso, ou seja, tem direito de recomeçar a vida”, defende. Os políticos parecem pensar do mesmo jeito. “Tenho sido procurado por vários partidos”, conta Darci.

Para quem segue na luta pela floresta, a inserção de Darci na vida política e econômica de Medicilândia é algo para lamentar. É o que diz Angela Mendes, filha de Chico Mendes. “Medicilândia não merece alguém que assassina outra pessoa de forma covarde. Precisamos varrer da política pessoas com esse tipo de antecedente.”

No município que desmata para dar lugar ao gado, Bolsonaro teve 67,3% dos votos na última eleição


Reportagem e texto: Bruno Abbud
Fotos: Christian Braga
Edição: Fernanda da Escóssia
Edição de fotografia: Lela Beltrão
Checagem: Plínio Lopes
Revisão ortográfica (português): Valquíria Della Pozza
Tradução para o espanhol: Meritxell Almarza
Tradução para o inglês: Diane Whitty
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