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Edição 23 |
quinta-feira, 17 agosto, 2023 |
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Nossa Voz
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O ‘negacionismo progressista’ que nos governa
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Querida comunidade,
O colombiano Gustavo Petro acertou em cheio ao apontar o dilema de Lula, do Brasil e da maioria dos governos de esquerda e de centro-esquerda do mundo. “[Os governos de] direita têm um fácil escape, que é o negacionismo. Negam a ciência. Para os progressistas, é muito difícil. Gera então outro tipo de negacionismo: falar em transições”, afirmou ele na Cúpula da Amazônia, realizada nos dias 8 e 9 deste mês de agosto.
Petro se referia ao discurso da “transição” para energias renováveis e não poluidoras, usado por governantes como Lula para justificar a continuidade da exploração de combustíveis fósseis. Como SUMAÚMA antecipou, o presidente da Colômbia se esforçou para convencer os colegas a fazer um pacto pelo fim da exploração de petróleo na Amazônia, mas ficou falando sozinho. Seu isolamento denunciou o que tem aterrorizado jovens ativistas da geração de Greta Thunberg: a dificuldade de fazer com que políticos, a maioria homens moldados no – e pelo – século 20, sejam capazes de tomar decisões que contrariem suas crenças mais arraigadas – e são justamente essas as decisões necessárias e urgentes para limitar o aquecimento do planeta em 1,5 grau Celsius.
Ao apontar como o negacionismo de esquerda se articulava sob o escudo supostamente responsável da “transição energética”, o presidente colombiano afirmou que era um “disparate total” falar em emergência climática e seguir explorando combustíveis fósseis. Petro não só conquistou o protagonismo numa cúpula em que Lula era o anfitrião como explicitou as contradições do Brasil. Aqui, como em outras partes da América Latina, as gerações que estão hoje no poder foram esculpidas por mais de meio século de propaganda nacionalista que exaltava o petróleo como a melhor fonte de riqueza de uma nação.
Até o final do ano passado, o Brasil era governado por Jair Bolsonaro, um extremista de direita que incentivava a destruição da floresta e garantia impunidade aos desmatadores. Hoje, o Brasil é liderado por Lula, um homem de centro-esquerda que se forjou político no sindicalismo de fábrica. A imagem-símbolo da pujança de seu segundo mandato, encerrado em 2010, eram suas mãos sujas do petróleo do pré-sal. Treze anos depois, Lula voltou ao poder, e é impossível fingir não perceber que o petróleo e os demais combustíveis fósseis são os vilões que levam ao colapso da casa-planeta ao transfigurar o clima e, com ele, a geografia que a espécie humana acreditava ser imutável. Mas saber parece não ser suficiente para fazer o que é preciso.
Tanto é assim que a exploração de petróleo na bacia da foz do rio Amazonas, na chamada margem equatorial, foi o motivo da grande cisão no primeiro semestre deste terceiro mandato de Lula. O projeto da Petrobras, estatal brasileira de combustíveis fósseis, foi barrado pela pasta de Marina Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, como antecipamos com exclusividade. A maior parte do governo, porém, não engoliu essa negativa. Antes do início da cúpula, Lula garantiu que o povo da Amazônia poderia “continuar sonhando” com a exploração de petróleo.
O mundo acabou de viver o julho mais quente da história. Só nos últimos dias há catástrofes causadas por eventos extremos do Havaí à China e a Antártida derrete a níveis nunca vistos. Mas a esquerda que Lula representa acredita que o tempo ainda está sob controle humano. Na cabeça cimentada no século 20 dessa geração de políticos, dá para fazer dinheiro com o petróleo para ampliar o número de consumidores de mercadorias enquanto lentamente se faz a transição energética – ou “verde”. Mas, ainda assim, é preciso dizer: Lula é a melhor opção que temos.
Esta é a realidade – e é com ela que precisamos lidar. Para que as decisões urgentes sejam tomadas no tempo da urgência, só com muita pressão da sociedade civil. As 27 mil pessoas reunidas nos Diálogos Amazônicos que precederam o encontro dos presidentes fizeram a sua parte. Mas é preciso muito mais engajamento dos brasileiros e das populações dos países da Pan-Amazônia.
SUMAÚMA não é negacionista. Nós conhecemos os fatos em profundidade e agimos fazendo jornalismo para dar a melhor informação para que nossa comunidade de leitores possa agir.
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Eliane Brum
Semeadora e diretora de SUMAÚMA |
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