Jornalismo do centro do mundo

Criada sob o fogo

Queimada em 2022 na região da Amazônia onde Amazonas, Acre e Rondônia se encontram e formam uma espécie de ‘fronteira de desmatamento’. Foto: Nilmar Lage/Greenpeace

13 de setembro de 2022 SUMAÚMA nasceu numa Amazônia brasileira que ardia em chamas como não acontecia havia muitos anos. Grileiros e fazendeiros estavam incendiando a floresta para aproveitar a impunidade oferecida pelo governo de extrema direita de Jair Bolsonaro. SUMAÚMA foi criada como um ato de resistência na cidade de Altamira, no estado do Pará. “Como jornalistas, nos posicionamos ao lado dos povos-floresta na linha de frente da guerra movida contra a natureza”, proclamou nosso manifesto. Prometemos colocar a floresta em primeiro lugar, amplificar as vozes da Amazônia e concentrar o debate político nos centros de vida, e não nos de dinheiro e poder. Nossa plataforma trilíngue de reportagens, artigos e  podcast é apoiada por uma rede de parceiros e uma comunidade de leitores ativos.

Nascida durante a eleição

Antes de se tornar ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara escreveu: ‘Chegou a hora de aldear a política e reflorestar mentes’. Foto: Leo Otero/divulgação

2 de outubro de 2022 – A estreia de SUMAÚMA foi acelerada para que pudéssemos desempenhar um papel na histórica eleição brasileira de 2022. Já nos lançamos no modo de campanha. “Chegou a hora de aldear a política e reflorestar mentes”, declarou a então candidata Sonia Guajajara, que mais tarde se tornaria a primeira ministra dos Povos Indígenas, num artigo para a nossa segunda newsletter. A newsletter de estreia, em 13 de setembro, destacava a reportagem exclusiva feita no território Yanomami pela jornalista cofundadora Talita Bedinelli e pela antropóloga e tradutora Ana Maria Machado sobre a violência sexual contra mulheres indígenas por garimpeiros ilegais.

O tema estava claramente entrelaçado com a força destrutiva da política nacional. A terrível situação para toda a vida – humana e não humana – da floresta não poderia melhorar sem uma mudança de poder, conforme argumentava nosso editorial. O texto explicava por que SUMAÚMA apoiava o candidato do Partido dos Trabalhadores, Luiz Inácio Lula da Silva, como a melhor chance de derrotar Bolsonaro, em cujo governo, de 2019 a 2022, a devastação atingiu mais de 2 bilhões de árvores.

Lute como floresta”, conclamou nossa diretora Eliane Brum, também coautora, com Jonathan Watts, de um artigo para a revista americana Time, num dos primeiros exemplos das parcerias que são uma parte fundamental da estratégia de SUMAÚMA para espalhar a mensagem da floresta para o maior número possível de leitores.

O retorno de Marina

SUMAÚMA relatou os ataques políticos contra a ministra Marina Silva: principal alvo da direita e da indústria extrativista. Foto: Sergio Lima/AFP

25 de outubro de 2022 – Marina Silva, a personagem política nascida na Amazônia mais influente do Brasil, explicou por que, depois de uma separação política de 14 anos de Lula, ela tinha decidido apoiá-lo no segundo turno da eleição presidencial. Em entrevista exclusiva a SUMAÚMA, a então recém-eleita deputada federal disse acreditar que Lula era o homem certo para salvar uma agenda socioambiental – com foco em ação climática, redução da pobreza e proteção florestal – que havia sido perdida sob o comando de Bolsonaro e seus antecessores. Posteriormente, Marina executaria essa política progressista já como ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, um cargo que a tornou o principal alvo da direita predatória e da indústria extrativista. SUMAÚMA seguiu relatando os ataques políticos contra Marina, a traição dos colegas e a necessidade de Lula dar mais suporte à ministra se o governo pretende ter relevância.

Avaliação das metas climáticas de Lula

Analisamos os planos de Lula para criar uma aliança de superpotências da biodiversidade e as mudanças que o novo governo poderia trazer. Foto: Ahmad Gharabli/AFP

16 de novembro de 2022 – Lula foi elogiado na COP-27, a Conferência Climática das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas realizada em Sharm el-Sheikh, no Egito, após a vitória eleitoral apertada sobre Bolsonaro e a subsequente promessa de buscar o desmatamento zero na floresta amazônica. Sem dúvida, essa foi a notícia mais positiva para o clima em qualquer parte do mundo em 2022. Sem sucumbir à euforia, SUMAÚMA manteve o foco nas exigências indígenas na COP do Egito por meio de outra colaboração na cobertura, desta vez com a organização independente de jornalismo Agenda Propia, sediada na Colômbia. Analisamos os planos de Lula para criar uma aliança de superpotências da biodiversidade com a Indonésia e a República Democrática do Congo e em seguida examinamos as mudanças que o novo governo poderia trazer ao tomar posse, no dia 1º de janeiro.

Fiel à sua missão de buscar e amplificar as vozes da floresta, tendo como base entrevistas com líderanças quilombolas, ribeirinhas e indígenas – como Davi Kopenawa Yanomami – e a juventude da Amazônia, SUMAÚMA fez uma extensa série sobre as esperanças despertadas pelo novo governo. Também escutamos cientistas que, em suas falas, representaram outras espécies, como o peixe acari-zebra, o macaco zogue-zogue de Alta Floresta, o pássaro jacamim-de-costas-escuras, a borboleta Prepona narcissus e os fungos recém ou ainda não descobertos na Amazônia.

Esses tempos otimistas culminaram na posse de Lula, com o novo presidente subindo a rampa do Palácio do Planalto de braços dados com o líder indígena Kayapó Raoni Metuktire. Depois de algumas vitórias eleitorais e vários nomes indígenas empossados na cúpula do novo governo, a deputada federal Célia Xakriabá disse a SUMAÚMA: “O Congresso não será mais cinza. Ele vai ter a nossa cor: jenipapo e urucum”.

Defesa da democracia

Nossos repórteres examinaram a alegação de Lula de que garimpeiros e madeireiros estavam envolvidos nos atos de terrorismo. Foto: Edison Bueno/Estadão Conteúdo

8 de janeiro de 2023 – Uma tentativa de golpe de apoiadores de Bolsonaro causou estragos no Congresso, no Supremo Tribunal Federal e na sede do governo, o Palácio do Planalto. SUMAÚMA agiu rapidamente para defender a democracia. “Que cada um dos criminosos seja identificado, encontrado, julgado e punido”, exigimos em um editorial de emergência no dia seguinte, condenando a violência e insistindo que Bolsonaro (que estava, convenientemente, “em férias” na Flórida) voltasse ao Brasil para enfrentar a Justiça. Em artigos posteriores sobre o tema, nossos repórteres examinaram a alegação de Lula de que garimpeiros e madeireiros da Amazônia estavam envolvidos nos atos de terrorismo e apontaram os nomes de alguns dos que haviam financiado a tentativa de golpe. As ligações entre crime organizado, políticos e destruição ambiental são sempre um foco central em nossas reportagens.

Um genocídio exposto

SUMAÚMA revelou com exclusividade que 570 crianças indígenas com menos de 5 anos tinham morrido nos últimos quatro anos vitimadas por doenças tratáveis

20 de janeiro de 2023 – Um escândalo de negligência e abuso há muito tempo latente na Terra Indígena Yanomami explodiu como crise humanitária em larga escala depois que SUMAÚMA revelou com exclusividade que 570 crianças indígenas com menos de 5 anos tinham morrido nos últimos quatro anos vitimadas por doenças tratáveis. O caso foi desmembrado em várias reportagens, desde a nossa primeira edição, sobre o crescente desastre causado pela invasão de garimpeiros de ouro no maior território indígena do Brasil, que supostamente estaria sob a proteção do Estado.

No dia seguinte à publicação da reportagem “Não estamos conseguindo contar os corpos”, Lula declarou emergência, fez uma visita não programada à área e enviou equipes de saúde ao local. Depois da mudança de governo, repórteres de SUMAÚMA escreveram várias reportagens acompanhando o caso e lançamos uma campanha para limitar o uso de ouro enquanto os vendedores não conseguem provar que sua origem é sustentável e ética. Para detalhar ainda mais esse ponto, trouxemos um artigo assinado por dois especialistas, como parte de uma parceria com o departamento de Direito do King’s College London.

Cobertura de Davos em estilo amazônico

Maickson Serrão levou uma mensagem ao Fórum Económico Mundial: para defender a Amazônia é preciso proteger quem vive nela. Foto: Walter Duerst/WEF

5 de fevereiro de 2023 – O Fórum Econômico Mundial em Davos, na Suíça, contou com um representante de Manaus, um ribeirinho indígena de 30 anos que, entre suas muitas outras qualidades, é também um dos membros mais estilosos da equipe da Rádio SUMAÚMA. Não à toa, Maickson Serrão é mais conhecido por seu apelido, Pavulagem, que na linguagem amazônida significa “uma pessoa que gosta de se mostrar”. O efeito pôde ser visto em grande estilo em Davos, onde Maickson usou uma roupa do estilista amazônico Sioduhi, que também foi tema de um perfil em SUMAÚMA.

Serrão usou o seu talento para levar uma mensagem séria aos participantes do fórum na Suíça: a de que, se eles se preocupam com a crise climática, devem apoiar os povos indígenas no Brasil contra garimpeiros, madeireiros e grileiros. O fórum lançou um documento chamado “Incorporando o Conhecimento Indígena na Conservação e Restauração de Paisagens”, que reconhece a importância dos povos originários na proteção de sumidouros de carbono e de centros de biodiversidade globalmente relevantes. Para Maickson, o resultado saiu “com muito atraso”. Perfis detalhados e artigos de opinião são duas formas de SUMAÚMA amplificar as vozes das pessoas da floresta. Outros autores incluem a ativista quilombola Natalha Theofilo, que relatou como estava vivendo escondida com a família após ter recebido ameaças de morte pela atuação de seu marido, o líder camponês Erasmo Theofilo, de Anapu, no Pará; o militante da reforma agrária Geraldo Magela de Almeida Filho, que contou sua experiência de 17 anos como fugitivo depois que foi envolvido no assassinato da freira americana Dorothy Stang; e Patri, uma mulher venezuelana que atuou como prostituta no território Yanomami e revelou a experiência de trabalhar num garimpo.

Questionamento da licença da barragem de Belo Monte

Com a licença de operação pronta para renovação, SUMAÚMA instou Lula a reconsiderar seu apoio prévio. FOTO: LALO DE ALMEIDA/FOLHAPRESS

6 de março de 2023 – O projeto de infraestrutura mais controverso da Amazônia é a imensa barragem da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu. Com a licença de operação pronta para renovação, SUMAÚMA instou Lula a reconsiderar seu apoio prévio, dada a riqueza de provas de que a barragem está causando mais danos e gerando menos eletricidade do que o previsto. A repórter Helena Palmquist e o fotógrafo Soll Sousa, baseados na Amazônia, acompanharam equipes de moradores locais que coletam dados menosprezados pelas autoridades ambientais e pelo operador da barragem. Eles descobriram, entre outros estragos, que a barragem tinha transformado um viveiro de peixes num cemitério, destruindo os meios de existência dos pescadores da área, como Raimundo da Cruz e Silva, que relata de forma eloquente o fim da pesca em sua região. A situação continua extremamente grave, especialmente porque o seminário técnico em Brasília revelou a escassez de provas que sustentam o regime hidrológico da barragem, que sequestra 70% da água da Volta Grande do Xingu, causando o que é denunciado por indígenas e ribeirinhos como “ecocídio”.

Investigação de projetos petrolíferos

Pássaros na praia de Goiabal, no Amapá. Fatos sobre a exploração de petróleo na foz do Amazonas foram revelados e cobertos pela repórter especial Claudia Antunes. Foto: Victor Moriyama/Greenpeace

28 de abril de 2023 – Os planos da Petrobras de explorar campos de petróleo na bacia da foz do rio Amazonas dividiram o governo Lula e causaram muitas de suas primeiras tensões. De um lado estão a indústria de combustíveis fósseis e seus apoiadores. De outro, a ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, que disse a SUMAÚMA que em sua opinião a estatal deveria procurar caminhos alternativos. O ministério cumpriu as expectativas nesse ponto. SUMAÚMA revelou com exclusividade que um estudo do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima tinha se posicionado contra o plano de exploração na Amazônia, algo totalmente alinhado com as preocupações nacionais sobre possíveis vazamentos de petróleo e com os argumentos da comunidade científica global de que nenhum novo projeto de petróleo e gás deverá ser aprovado se o mundo quiser evitar os níveis perigosos de aquecimento global. A batalha segue com Marina bastante enfraquecida por um Congresso hostil e Lula oferecendo um apoio vacilante, por um lado, por outro acenando com a continuidade da abertura de uma nova frente de exploração de petróleo na Amazônia. Os fatos e reviravoltas desse impasse crucial foram revelados e cobertos exaustivamente pela repórter especial Claudia Antunes, que também escreveu reportagens investigativas sobre a agenda da indústria de créditos de carbono e a pressão política na Amazônia de Aldo Rebelo, ex-aliado dos presidentes Lula e Dilma Rousseff, do PT, que agora se mistura com apoiadores de Jair Bolsonaro e grileiros em Altamira, onde promove uma pauta agromilitar.

As ligações entre a Amazônia e as mudanças climáticas também são cobertas em editoriais, entrevistas com cientistas e parcerias com jornalistas talentosos envolvidos com o projeto Colapso, organizado pela plataforma Dromómanos, baseada no México.

A batalha do marco temporal

A deputada Célia Xakriabá (ao microfone): o vermelho do protesto simboliza o sangue indígena nas mãos dos que defendem o marco temporal. Foto: Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

31 de maio de 2023 – Além do forte argumento da justiça histórica, o valor da demarcação de mais terras indígenas está amplamente comprovado por inúmeros estudos científicos que mostram que essa é a maneira mais rentável de proteger as florestas, sequestrar carbono e manter habitats para a vida selvagem. Essa lógica encorajou Lula e seus ministros a aprovar novos territórios (seis em abril e mais dois em setembro). Mas, como há outros em planejamento, o Congresso, dominado por grileiros e latifundiários, assim como por lobistas das indústrias de ultraprocessados e agrotóxicos, propôs um novo estratagema para abrandar – ou mesmo reverter – a aprovação de mais territórios indígenas. O projeto de lei do marco temporal estabeleceria limitações injustas nas demarcações, além de destruir a essência das conquistas garantidas aos povos originários na Constituição brasileira de 1988. Para surpresa de ninguém, ele está sofrendo forte oposição de (quase) todos os lados. SUMAÚMA cobriu e explicou todas as etapas do debate, da paixão pela causa e das cores do Acampamento Terra Livre, em Brasília, às duras batalhas no Congresso e no Supremo Tribunal. “Sem demarcação não há democracia” é o grito de mobilização que ouvimos repetidas vezes. Os maracás de protesto não serão silenciados.

Lembrando Bruno e Dom

BEATRIZ MATOS E ALESSANDRA SAMPAIO SE REÚNEM EM BRASÍLIA PARA UMA CONVERSA UM ANO APÓS O ASSASSINATO DE SEUS MARIDOS, BRUNO PEREIRA E DOM PHILLIPS. FOTO: PABLO ALBARENGA/SUMAÚMA

7 de junho de 2023 – Um ano depois do assassinato do indigenista brasileiro Bruno Pereira e do jornalista britânico Dom Phillips no Vale do Javari, suas viúvas seguem determinadas a manter viva a memória de seus companheiros. SUMAÚMA organizou um encontro dessas duas mulheres notáveis. Elas fazem campanhas por vários dos mesmos valores da floresta que inspiraram seus parceiros. Beatriz Matos, viúva de Bruno, tornou-se diretora do Departamento de Proteção Territorial e de Povos Isolados do Ministério dos Povos Indígenas. Alessandra Sampaio, viúva de Dom, está planejando criar uma ONG de educação na Amazônia. Depois do choque e da dor pelo crime hediondo, elas querem não só justiça, mas também que as mortes ajudem a sensibilizar as pessoas para a importância da floresta, dos povos indígenas e outras comunidades tradicionais que são seus melhores protetores, assim como para os perigos enfrentados por ativistas ambientais e jornalistas.

São sentimentos ecoados por Beto Marubo, morador do Vale do Javari, e pelos ativistas indígenas que lideraram várias das missões de busca que ajudaram a localizar os corpos de Bruno e Dom. Num artigo comovente, Marubo explicou como diferentes comunidades da região estavam de luto pelas vítimas e determinadas a não deixar que as mortes fossem em vão. Os idealizadores de SUMAÚMA Eliane Brum e Jonathan Watts, que eram amigos de Dom, alinham-se totalmente com essa visão.

Um guariba para contar a história da floresta

Com belas ilustrações de Pablito Aguiar, texto de Jonathan Watts e orientação, mentoria e conhecimento de Raimunda Tutanguira, ‘Guariba’ quer levar as maravilhas da Amazônia a uma geração distanciada da natureza

19 de julho de 2023 – Queimado, ferido e sofrendo de amnésia, Guariba é um macaco que precisa reaprender a história da Amazônia para poder encontrar a família e defender sua casa. A história dele é a de um anti-Tarzan: não a de um lorde humano que aprende a dominar os macacos da floresta, mas a de um primata que por fim compreende os caminhos imprudentes da humanidade. Com belas ilustrações de Pablito Aguiar, texto de Jonathan Watts e orientação, mentoria e conhecimento de Raimunda Tutanguira, a saga de Guariba é uma fantasia baseada na ciência e na história que visa levar as maravilhas da Amazônia a uma geração distanciada da natureza. Lançada em julho, a série em quadrinhos está alinhada com a missão de SUMAÚMA de encontrar maneiras criativas de representar espécies não humanas e alcançar outros públicos. Estamos constantemente em busca de novas linguagens e formas de compartilhar uma perspectiva da floresta com um mundo mais vasto. Como parte desse projeto, também lançamos uma série explicativa sobre temas e jargões amazônicos, o Amazonário, elaborada por Claudio Angelo, a fim de que mais pessoas incorporem as ferramentas necessárias para participar do debate global sobre a floresta. Vejam o primeiro exemplo, sobre créditos de carbono. Mais está por vir – e ainda teremos muitas outras iniciativas para compartilhar conhecimento e acessar a sabedoria da floresta e de comunidades tradicionais.

A convocação de Raoni e Lula

O chamado de Raoni: representantes de 54 povos originários foram ouvir o cacique na aldeia Piaraçu, no Mato Grosso, Amazônia brasileira. Foto: Pablo Albarenga/SUMAÚMA

28 de julho de 2023 – O aclamado cacique Kayapó Raoni Metuktire convocou líderes indígenas e apoiadores de todo o Brasil para uma reunião na aldeia de Piaraçu, em Mato Grosso. No evento, a questão da sucessão do líder indígena estava na mente de muitos dos presentes. A data do aniversário de Raoni é desconhecida, mas acredita-se que o cacique esteja na casa dos 90 anos e, embora continue notavelmente lúcido, ele reconhece que talvez não consiga manter o seu nível atual de ativismo por muito mais tempo. Dificilmente alguém o substituirá à altura, mas há vários potenciais candidatos a herdar seu manto. Existe uma pequena chance de surpresa com a nova geração de mulheres líderes, como Sonia Guajajara, Joenia Wapichana, Alessandra Korap Munduruku e Juma Xipaia, que hoje têm poder político e visibilidade impensáveis uma década atrás. SUMAÚMA também estava lá e notou a insatisfação entre os presentes com o fato de Lula ter declinado o convite por motivo de saúde. Lula tinha a sua própria reunião para preparar: a cúpula da Amazônia, em Belém, que se mostrou uma troca empolgante de ideias sobre o futuro da floresta tropical, embora resultasse em poucos compromissos concretos e houvesse uma forte relutância em enfrentar a questão da exploração de petróleo e gás na região. Belém pode viver muitas experiências semelhantes, já que deve sediar a COP-30 em 2025.

Agentes federais combatem o crime organizado

O Ibama encontrou 21 rebanhos ilegais no território indígena Ituna/Itatá. Os incêndios são uma estratégia dos grileiros para dificultar a operação. Foto: Lela Beltrão/SUMAÚMA

5 de setembro de 2023 – As operações do governo federal para enfrentar garimpeiros e pecuaristas na Amazônia têm gerado algumas das imagens mais marcantes dos últimos anos. Repórteres de SUMAÚMA tiveram acesso exclusivo a uma missão no estado do Pará para remover milhares de bovinos de propriedade de grileiros que tinham invadido território indígena. Foi uma viagem difícil porque os invasores danificaram pontes, causaram incêndios e ameaçaram motoristas para impedir o avanço da missão. Uma resistência ainda mais violenta foi registrada em operações anteriores para expulsar garimpeiros do território Yanomami. O envolvimento do crime organizado provocou reação armada às forças do Estado.

Os esforços do governo federal parecem estar dando resultado. Os alertas de desmatamento caíram quase à metade nos primeiros oito meses deste ano em comparação com o mesmo período de 2022. Os índices estão longe do desmatamento zero, mas têm demonstrado uma diminuição animadora. O melhor é que há muito menos incêndios do que no ano passado – e desta vez são, frequentemente, as máquinas de destruição dos criminosos que estão em chamas, e não a floresta tropical. Reduzir o desmatamento, porém, já não é suficiente – é preciso reflorestar a Amazônia.

A diferença que faz um ano

Amanhecer espetacular perto da aldeia Piaraçu na Terra Indígena Xingu, no estado do Mato Grosso. Foto: Pablo Alvarenga/SUMAÚMA

13 de setembro de 2023 – Desde que SUMAÚMA foi lançada, o Brasil mudou de forma positiva. O país agora tem um presidente que se preocupa com o clima e a Amazônia. A democracia resistiu a um ataque de forças alinhadas com criminosos ambientais. As ações federais reduziram o desmatamento e a mineração ilegal, as mulheres indígenas ocupam cargos de primeiro e segundo escalão no governo e oito territórios indígenas foram demarcados. Lula e Marina Silva estão comprometidos com a meta de desmatamento zero até 2030. Há porém um longo caminho a percorrer, especialmente quando se trata da ameaça representada por projetos de infraestrutura e exploração de combustíveis fósseis.

SUMAÚMA também mudou. Dos cinco fundadores que publicaram a primeira edição, somos agora uma equipe fixa de 21 pessoas. Ao longo dos últimos 12 meses, publicamos mais de 210 artigos, todos traduzidos em três línguas, para que as vozes da floresta possam atingir um público mais amplo. As nossas redes sociais conquistaram mais de 100 mil seguidores e nossa newsletter tem cerca de 6 mil assinantes. A comunidade está ficando mais forte. Quase 1.700 pessoas contribuem mensalmente para nossa campanha de crowdfunding, muitas delas participando de debates e webinários. Agradecemos a elas e aos doadores filantrópicos por apoiarem SUMAÚMA e nos darem a possibilidade de fazer parte de uma mudança positiva na Amazônia e no planeta. Mas não estamos acomodados sobre o que já foi conquistado. Há muito trabalho a ser feito, novas campanhas e iniciativas a ser lançadas, desafios enormes a ser enfrentados. Sem esquecer da luta nem por um segundo, estamos gratos por compartilhar este feliz aniversário com quem tornou isso possível. Obrigado a todas, todos, todes.


Checagem: Plínio Lopes
Revisão ortográfica (português): Elvira Gago
Tradução para o espanhol: Meritxell Almarza
Tradução para o português: Denise Bobadilha
Edição de fotografia: Lela Beltrão
Montagem da página: Érica Saboya

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